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Essa discriminação ocorreu - e ainda ocorre - em contextos históricos e sociais diferenciados, e veio produzida por instituições que tinham o objetivo de combater o que lhes fosse ameaçador ou que achassem associadas às práticas diabólicas, ao crime e à contravenção.
No caso do marabaixo, há anos venho relatando episódios de confronto entre a igreja católica (e seus prepostos eclesiásticos e seculares), e os agentes populares do sagrado, estes que, por serem afro descendentes, mestiços e principalmente por serem pobres, foram e são discriminados, visto o ranço estereotipado de que são “gente ignorante” e supersticiosa.
É do século XIX a influência do evolucionismo que tomava como modelo de religião “superior” o monoteísmo cristão e via as religiões de transe como formas “primitivas“ ou “atrasadas” de culto. Para Vagner Gonçalves da Silva (Revista Grandes Religiões nº 6), nesse tempo “religião” opunha-se a “magia” da mesma forma que as igrejas (instituições organizadas de religião) opunham-se às “seitas” (dissidências não institucionalizadas ou organizadas de culto).
É do século XIX também os primeiros escritos sobre o marabaixo. Em um deles um anônimo articulista o ataca, dizendo-se aliviado porque “afinal desapareceu o infernal folguedo, a dança diabola do Mar-Abaixo”. Ele afirma que “será uma felicidade, uma ventura, uma medida salutar aos órgãos acústicos se tal troamento não soar mais...”. Na sua narrativa preconceituosa vai mais além ao dizer que “Graças ao Divino Espírito-Santo, símbolo de nossa santa religião, que só exige a prática de boas ações, não ouviremos os silvos das víboras que dançam ao som medonho dos gritos dos maracajás (...), que é suficiente a provocar doudice a qualquer indivíduo”. Assevera adiante “Que o Mar-Abaixo é indecente, é o foco das misérias, o centro da libertinagem, a causa segura da prostituição”. E finaliza conclamando “Que os pais de famílias, não devem consentir as suas filhas e esposas freqüentarem tão inconveniente e assustador espetáculo dessa dança, oriunda dos Cafres”. (Jornal Pinsonia, 25 de junho de 1898).
Discursos de difamação do marabaixo como este e a posição em favor de sua extinção ocorreram seguidamente. O próprio padre Júlio Maria de Lombard quebrou a coroa de prata do Espírito Santo que estava na igreja de São José e mandou entregar os pedaços aos festeiros. O povo se revoltou e só não invadiu a casa padre para matá-lo graças á intervenção do intendente Teodoro Mendes.
Com a chegada do PIME – Pontifício Instituto das Missões Estrangeiras - em Macapá (1948) o marabaixo sofreu um período de queda, mas suportado com tenacidade por Julião Ramos, que não o deixou morrer. Tiraram-lhe inclusive a fita da irmandade do Sagrado Coração de Jesus, da qual era sócio fiel.
Nesse período os padres diziam que o marabaixo era macumba, que era coisa ruim, e combatiam seus hábitos e crenças, tidos como hediondos e pecaminosos, do mesmo jeito que seus antecessores o fizeram no tempo da catequização dos índios. Mas o bispo dessa época, D. Aristides Piróvano, considerava Mestre Julião “um amigo” (Ver Canto, Fernando in “A Água Benta e o Diabo”. Fundecap, 1998).
Não é de hoje que o marabaixo é discriminado. Aliás, as manifestações culturais de origem africana sempre foram vistas como ilegais ao longo da história do Brasil. Do samba à religião, seus promotores foram vítimas de denúncias que os boletins de ocorrências policiais e os processos judiciais relatam como vadiagem, prática de falsa medicina, curandeirismo e charlatanismo, entre outras acusações, muitas vezes com prisões e invasões de terreiros.
Essa discriminação ocorreu - e ainda ocorre - em contextos históricos e sociais diferenciados, e veio produzida por instituições que tinham o objetivo de combater o que lhes fosse ameaçador ou que achassem associadas às práticas diabólicas, ao crime e à contravenção.
No caso do marabaixo, há anos venho relatando episódios de confronto entre a igreja católica (e seus prepostos eclesiásticos e seculares), e os agentes populares do sagrado, estes que, por serem afro descendentes, mestiços e principalmente por serem pobres, foram e são discriminados, visto o ranço estereotipado de que são “gente ignorante” e supersticiosa.
É do século XIX a influência do evolucionismo que tomava como modelo de religião “superior” o monoteísmo cristão e via as religiões de transe como formas “primitivas“ ou “atrasadas” de culto. Para Vagner Gonçalves da Silva (Revista Grandes Religiões nº 6), nesse tempo “religião” opunha-se a “magia” da mesma forma que as igrejas (instituições organizadas de religião) opunham-se às “seitas” (dissidências não institucionalizadas ou organizadas de culto).
É do século XIX também os primeiros escritos sobre o marabaixo. Em um deles um anônimo articulista o ataca, dizendo-se aliviado porque “afinal desapareceu o infernal folguedo, a dança diabola do Mar-Abaixo”. Ele afirma que “será uma felicidade, uma ventura, uma medida salutar aos órgãos acústicos se tal troamento não soar mais...”. Na sua narrativa preconceituosa vai mais além ao dizer que “Graças ao Divino Espírito-Santo, símbolo de nossa santa religião, que só exige a prática de boas ações, não ouviremos os silvos das víboras que dançam ao som medonho dos gritos dos maracajás (...), que é suficiente a provocar doudice a qualquer indivíduo”. Assevera adiante “Que o Mar-Abaixo é indecente, é o foco das misérias, o centro da libertinagem, a causa segura da prostituição”. E finaliza conclamando “Que os pais de famílias, não devem consentir as suas filhas e esposas freqüentarem tão inconveniente e assustador espetáculo dessa dança, oriunda dos Cafres”. (Jornal Pinsonia, 25 de junho de 1898).
Discursos de difamação do marabaixo como este e a posição em favor de sua extinção ocorreram seguidamente. O próprio padre Júlio Maria de Lombard quebrou a coroa de prata do Espírito Santo que estava na igreja de São José e mandou entregar os pedaços aos festeiros. O povo se revoltou e só não invadiu a casa padre para matá-lo graças á intervenção do intendente Teodoro Mendes.
Com a chegada do PIME – Pontifício Instituto das Missões Estrangeiras - em Macapá (1948) o marabaixo sofreu um período de queda, mas suportado com tenacidade por Julião Ramos, que não o deixou morrer. Tiraram-lhe inclusive a fita da irmandade do Sagrado Coração de Jesus, da qual era sócio fiel.
Nesse período os padres diziam que o marabaixo era macumba, que era coisa ruim, e combatiam seus hábitos e crenças, tidos como hediondos e pecaminosos, do mesmo jeito que seus antecessores o fizeram no tempo da catequização dos índios. Mas o bispo dessa época, D. Aristides Piróvano, considerava Mestre Julião “um amigo” (Ver Canto, Fernando in “A Água Benta e o Diabo”. Fundecap, 1998).
O preconceito dos padres italianos com o marabaixo tem apoio num lastimável “achismo”. Os participantes são católicos e crêem nos santos do catolicismo, tanto que a festa é dedicada ao Divino Espírito Santo e à Santíssima Trindade e não a entidades e voduns como pensam. Nem ao menos há sincretismo nele.
E se assim fosse? Qual o problema? Antes de emitirem um julgamento subjetivo sobre um fato cultural é preciso conhecê-lo. É preciso ter ética. Ora, sabe-se que todos os sistemas religiosos baseiam-se em categorias do pensamento mágico. Uma missa ”comporta uma série de atos simbólicos ou operações mágicas” (Vagner Silva op. cit.). Observe-se as bênçãos, a transubstanciação da hóstia em corpo de Cristo, por exemplo. Um ritual de umbanda comporta a mesma coisa.
O marabaixo tem rituais próprios, ainda que um tanto diferentes. Por isso e apesar do preconceito ainda sobrevive. Valei-nos, Santo Negro Benedito!
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Do Web Jornal: Corrêa Neto - Por Fernando Canto (Sociólogo)
parabens ao marabaixo!e que seja eterno!viva viva viva!
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